sábado, dezembro 01, 2007

"Momentos há em que suponho, seres um milagre criado só para mim", escrevi-te eu nestas paredes, enganando-me com a certeza que um dia me visitarias e me lerias e me compreenderias. Em tantos dias, foram poucas as vezes que cruzaste as portas que te abri, na esperança de perceberes a essência de quem sou. E mesmo assim, sentei-me durante tanto tempo entre estas paredes, mesmo no centro, acreditando que era aí que devia estar para que me visses logo que tivesses a coragem de entrar. Hoje questiono-me se alguma vez o fizeste. Incrível o poder de uma questão, poder que detenho, e que nunca aceitaste ou com o qual convives mal. Esperavas que abandonasse as questões, como se abandonasse a minha essência, e me deixasse levar para futuros incertos, aos quais me entreguei voluntariamente, mas que me consumiam pouco a pouco, me afastavam de mim próprio, me modificavam, seguindo uma mutação que em todos ocorre.
Hoje (teimo em escrever hoje, como se o pudesse dissociar dos ontens e dos amanhãs), já sinto o frio que entra por tantas portas abertas. Sinto-me tentado a fechá-las, uma a uma, para recuperar cá dentro tudo o que deixei sair. Mas não te quero deixar de fora. Será sempre tua a maior parede desta casa, cobrirei-a com o teu nome e com a nossa história.
As pedras que piso, por estarem cobertas de uma areia grossa, gritam um som que me arrepia. Sigo acompanhado por dúvidas que desejo abandonar, enterrar debaixo da terra onde me encontro. Cada grão de areia é um sonho, um plano, que vou calcando cada vez mais.
Rodeiam o caminho, árvores enormes cujas folhas tapam a luz. Não sei onde estou. Esta sensação que não me larga, de incerteza, torna-me perdido numa estrada que só tem um sentido, contrário ao que eu dantes percorria. São sombras que estão a meu lado. Sombras do que pensei, do que senti, que se materializam e desmaterializam a cada respiração.